R e v i s t a . e l e c t r ó n i c a . d e . f i c ç ã o . c i e n t í f i c a . e . f a n t á s t i c o

Crónicas do Caos — Atractores Estranhos

por Jeffrey A. Carver

uma crítica de Jorge Candeias

publicada em 19.02.2004

Em Crónicas do Caos — Atractores Estranhos, Carver prossegue a história de John Bandicut, iniciada no primeiro volume desta série, Viagem a Neptuno. Neste segundo volume, vamos encontrar Bandicut no momento em que a estranha viagem que o retirou da nave que serviu para deflectir um cometa que se dirigia para a Terra termina num imenso mundo artificial extra-galáctico, o Metamundo, maior que um sistema solar, sem que Bandicut saiba onde está ou porque está ali.
Inicialmente sozinho com os dois robôs que o acompanham desde Tritão (Napoleão, ou Nappy, e Copérnico, ou Coppy), o herói rapidamente encontra companhia sob a forma de extraterrestres que, como ele, se aliaram a pedras tradutoras para desempenhar tarefas fundamentais para as respectivas espécies e se viram de seguida transportados para aquele lugar. Inicialmente Ik, um hraacheeano, mais tarde Li-Jared, um karelliano, e, quase no fim, um terceiro ET, este mais semelhante a um ser humano. Além, claro, do quarx.
Mas parece que é imagem de marca de Carver que a agitação seja constante, e por isso rapidamente se percebe que será tarefa de Bandicut e dos seus novos companheiros combater um tal bujam que constitui uma forte ameaça à sobrevivência do mundo artificial. O bujam (ou boojum, no original) parece ser uma espécie de vírus informático extraordinariamente sofisticado e consciente (e malévolo), que infecta a infra-estrutura de gestão do Metamundo, tentando destruí-lo.
O romance é, assim, sobre a guerra entre o grupo de portadores de pedras-tradutoras e o bujam, na qual este parece ser sempre, ou quase sempre, infinitamente mais poderoso do que os seus adversários (afinal de contas, o ser informático consegue controlar até certo ponto os sistemas de apoio de vida e a própria natureza dos diferentes habitats do Metamundo), adversários esses que contam apenas com o seu engenho, com as pedras-tradutoras, e com o auxílio do povo-sombra, um povo de "seres fractais" (à semelhança do quarx), que têm a responsabilidade da manutenção de uma parte das redes de infraestrutura do Metamundo. Mas têm também um joker, sob a forma do quarx, e trunfos metálicos chamados Napoleão e Copérnico, ajustados por forma a transcender a condição de meros robôs e a ascender à consciência. Isto muito embora paire sobre eles a possibilidade de terem sido infectados pelo bujam e não serem, portanto, dignos de confiança.
É um livro muito rico em termos de ideias, bastante mais que o primeiro volume das Crónicas do Caos. É também um livro com uma construção bem melhor que a do primeiro, sem mastigações, com uma complexidade de enredo bem adequada, com muito pouco de gratuito. É, portanto, um livro mais agradável que o primeiro, um livro que se lê melhor e que não aborrece.
Além disso, pode ler-se independentemente do primeiro volume. È certo que a leitura de Viagem a Neptuno fornece informações que são úteis para o desfrute total de Atractores Estranhos, mas não são determinantes. A história deste romance faz sentido em si mesma, mesmo que nos esqueçamos de que faz parte de um todo maior. E isto, meus caros, é uma qualidade importante em qualquer trilogia (ou duologia, ou tetraogia, etc.)
Falemos agora de traduções...
Em geral, é péssima política entregar os diferentes volumes de uma mesma obra a diferentes tradutores. Especialmente numa área que exige tanto de um tradutor como a ficção científica que, com os seus neologismos omnipresentes e os conceitos, palavras e expressões retiradas directamente da linguagem científica, é das formas literárias mais complicadas de traduzir. O resultado é invariavelmente uma manta de retalhos, com os tradutores (que muitas vezes trabalham em simultâneo) a não lerem o trabalho dos colegas, a não coordenarem esforços, a não compararem notas nem fazerem escolhas conjuntas.
Mas quando a tradução de um primeiro volume é tão catastrófica como a de Viagem a Neptuno, mudar de tradutor é quase uma obrigação.
O que vou escrever a seguir é um pouco deprimente para o estado das coisas no que diz respeito à nossa tradução, mas o que acaba por surpreender mais na tradução de Pedro Miguel Dias é que é excelente. Sim, leram bem. Atractores Estranhos tem uma óptima tradução, cuidada, cheia de escolhas inteligentes e ponderadas, enfim, um trabalho que dá gosto ler. O contraste com o primeiro volume não podia ser maior. Façam favor de pagar bem a este tradutor e de lhe dar muito trabalho, porque nós bem precisamos de mais traduções destas.
Tudo somado, esta edição merece quatro estrelas. Pena qua a capa seja tão mazinha.

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Crónicas do Caos - Atractores Estranhos

por Jeffrey A. Carver

Publicações Europa-América

colecção Nébula, nº 77

tradução de Pedro Miguel Dias

2000

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Jorge Candeias escreveu:

 

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2002

(leia a crítica de Octávio Aragão)

 

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e escreveu a introdução e os contos:

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