A Casa em Espiral
por Isabel Cristina Pires
uma crítica de Jorge Candeias
publicada em 05.12.2002
republicada em 03.09.2003
Isabel Cristina Pires tem no currículo um acontecimento que vem enchendo de embaraço, desde então, quer os académicos quer as pessoas ligadas à ficção científica: a conquista do Prémio Caminho de Ficção Científica de 1987, com a colectânea Universal, Limitada. O embaraço tem razões de ser diametralmente opostas: os académicos, especialmente aquela vasta maioria que é profundamente preconceituosa relativamente à FC, sentem embaraço por uma autora que tem desenvolvido a sua actividade literária especialmente na poesia e no conto fantástico ter ganho um prémio de ficção científica, e ter sido publicada numa colecção de ficção científica. A coisa chega ao absurdo (e a um certo grau de ridículo, convenhamos) quando, em pleno JL, Carlos Reis, professor catedrático da Universidade de Coimbra, apelida Universal, Limitada de livro "de poesia". Quem está ligado à FC, por outro lado, sente embaraço por um livro que, analisado sob o olho crítico da ficção científica, não tem a qualidade mínima (enquanto FC) para ser publicado, muito menos para vencer um prémio do género.
A Casa em Espiral, felizmente para todos, já não está envolvida em confusões. Não é, honesta e declaradamente, um livro de FC. Muito embora ainda seja um livro de contos que abordam, na sua maioria, temáticas ligadas ao fantástico.
Com efeito, dos dezasseis contos que compõem a colectânea, apenas três (O Pintor de Borboletas, Os Tigres Gregos e o mais longo de todos, O Talismã) não têm como tema ou motivo principal um ou outro aspecto do fantástico. Em todos os outros, a realidade que é descrita está envolta nas névoas da magia, ou então é uma realidade surreal e onírica que como que forma borbulhas no concreto.
Os 16 contos são muito iguais. Isabel Cristina Pires lida bem com as palavras, suficientemente bem para quase se poder dizer que a sua prosa é irrepreensível, e sem variações seja em qualidade, seja em estilo, de conto para conto. O problema é o conteúdo, aquilo que a autora diz ou deixa de dizer.
É que em todos os 16 contos, ao longo das 130 páginas de A Casa em Espiral, não consegui encontrar uma única ideia. Ali não há nada. Um vazio absoluto preenchido com jogos de palavras inconsequentes (embora bonitos e literariamente perfeitos), sem razão nem objectivo, a não ser, aparentemente, estarem lá. A Casa em Espiral nem sequer é um livro sobre o nada, sobre o vazio do que quer que seja. Limita-se a ser um livro vazio em si mesmo, 130 páginas de coisa nenhuma.
Um digno sucessor para Universal, Limitada, afinal de contas...
Será isto literatura? Aparentemente sim. Parece que a autora está bem conceituada entre os editores, vista a quantidade de livros que publicou desde 86. Agora, ninguém me convence de que seja boa literatura. Incluo-me declaradamente entre os que acham que jogos de palavras são apenas isso, jogos de palavras, e que lhes falta algo de muito importante para ascenderem a um patamar mais alto que a simples prestidigitação linguística.
Por isso, considero A Casa em Espiral um livro muito fraco. Bom para quem se satisfaça com palavras bonitas, mas nulo em todos os outros aspectos.
Uma estrela.
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