R e v i s t a . e l e c t r ó n i c a . d e . f i c ç ã o . c i e n t í f i c a . e . f a n t á s t i c o

Os Anais dos Heechee

por Frederik Pohl

uma crítica de Jorge Candeias

publicada em 01.08.2002

republicada em 04.09.2003

No original, editado em 1987, este livro chamou-se The Annals of the Heechee e era então o fim da série Heechee Saga (A Saga dos Heechee), que incluía mais três livros, todos eles anteriormente publicados na Argonauta. Entretanto, Pohl voltou ao mesmo universo, e com sucesso suficiente para que Hatching the Phoenix tenha sido incluída na antologia da melhor FC do ano 2000 editada por Gardner Dozois. Mas isso são outras histórias.
Nesta história, encontramos Robinette Broadhead, um explorador de Gateway (já vai) que em livros anteriores enriquece até ao absurdo e que aqui já está morto e transformado numa personalidade electrónica, viajando incorporeamente pelas redes informáticas de Gateway, de Jaws (calma), da Terra e de diversas naves em trânsito entre estes pontos, sempre acompanhado da sua mulher Essie (ou antes, da cópia da personalidade de Essie, a qual se mantém viva e de boa saúde como uma presença distante, longe da acção) e do seu programa favorito de informação, diagnóstico, mordomia, etc., etc., que recebeu a personalidade simulada de Albert Einstein, o próprio - eu disse que o Broadhead é podre de rico.
Quem não conhece esta série, é bom explicar desde já que Gateway é um asteróide que gira em torno do Sol, na Cintura dos Asteróides, no qual os exploradores terrestres foram encontrar um imenso porto espacial repleto de naves novinhas em folha, lá deixadas pelos Heechee, uma raça de humanóides magricelas, sempre com um saco pendurado entre as pernas, que muito tempo antes tinha decidido retirar-se para dentro do buraco negro do centro galáctico, a fim de proteger-se dos "Assassinos".
Quanto ao Jaws, é um satélite militar terrestre destinado à vigilância do Kugelblitz, um estranho objecto vermelho situado no halo da galáxia, e que é o sítio de onde os "Assassinos" (ou o "Inimigo", como é conhecido pelos terrestres) saíram para afugentar os Heechee, e de onde poderão voltar a sair um dia.
O Broadhead, como bom herói que é, acaba por ver-se obrigado a grandes decisões a fim de tentar salvar o Universo quando o Inimigo, como é inevitável, sai de dentro do Kugelblitz. Mas antes disso muitas páginas serão gastas em ambientação e na familiarização do leitor com todo este universo. É que, embora este livro seja sequência de livros anteriores, Pohl tem o cuidado de não obrigar o leitor a ler tudo o que está para trás antes de pegar n'Os Anais dos Heechee, o que é, sem dúvida, uma atitude simpática da parte dele. Mas a simpatia torna-se bastante cansativa de vez em quando. O livro acaba por ser grande, para os padrões da Argonauta (351 páginas, custa a crer que não o tenham partido em dois - e ainda bem que não o fizeram), e quando, pela vigésima vez, o velho Broadhead se esquece de contar a história (que é contada na primeira pessoa sempre que ele se encontra presente na cena) para, por entre reminiscências do passado mais ou menos longínquo, algumas das quais fundamentais para esta história do presente, divagar sobre a sua agridoce condição de personalidade virtual e as consequências que essa condição tem na interacção com o mundo físico e as capacidades especiais que lhe proporciona, o bocejo de irritação é irreprimível. É que tem interesse e piada à primeira, à segunda, à décima, mas chega a um ponto que já basta...
De resto, a história é contada numa prosa ligeira e divertida, com muitas piadinhas (nem todas bem sucedidas, mas que diabo: um tipo como o Broadhead nunca será um grande humorista, e as palavras são todas postas na boca dele), e saltos no fio da história postos nos sítios certos para conduzir o leitor de uma forma suave e indolor da primeira palavra até à última. É um romance despretencioso, que se lê bem e não tem quaisquer aspirações a obra-prima mas se limita a ser eficiente com um sorriso nos lábios virtuais de papel. É, de vez em quando, FC bastante hard, que pode levantar alguns problemas a leitores mais leigos nestas coisas das informáticas e afins (os quais, por outro lado, provavelmente nunca lerão esta crítica), e que entra um pouco em campos conexos ao misticismo, mas sem que essa faceta se sobreponha minimamente à história.
Quanto à tradução, para o que era hábito na Argonauta nestes anos, é boazinha e não se nota que estrague grande coisa. E isto, note-se, é um elogio...
Resumindo e cinematograficando, são quatro bolinhas.

Gostou deste texto? Ajude-nos a oferecer-lhe mais!

 

Os Anais dos Heechee

por Frederik Pohl

Livros do Brasil

Colecção Argonauta nº 385

tradução de Raul de Sousa Machado

1989

Jorge Candeias escreveu:

 

Sally

Edições Colibri

2002

(leia a crítica de Octávio Aragão)

 

Desconhece-se o Paradeiro de José Saramago

O Telepata Experiente no Reino do Impensável

Jorge Candeias organizou:

O Planeta das Traseiras

e escreveu a introdução e os contos:

O Caso Subuel Mantil

No Vento Frio de Tharsis

Artigos de Jorge Candeias

Críticas de Jorge Candeias

Entrevistas de Jorge Candeias

Jorge Candeias - página de autor