R e v i s t a . e l e c t r ó n i c a . d e . f i c ç ã o . c i e n t í f i c a . e . f a n t á s t i c o

Pátrias de Chuteiras

por Gerson Lodi-Ribeiro

noveleta publicada em 07.04.2002

republicada em 11.10.2003

Palmares e o Brasil, eternos inimigos, ambos potências mundiais no jogo, detentores de dois títulos cada, encontram-se na final do campeonato do mundo de futebol de 1986. Palmares? Sim, Palmares. Estamos num dos universos alternativos de Gerson Lodi-Ribeiro, e, neste, o Brasil que conhecemos encontra-se dividido em três estados: Brasil, Palmares e Nova Holanda.
Leia o conto em:

ISBN: 989-8072-10-5

ISBN (13): 978-989-8072-10-8

Historial

Publicado na antologia Outras Copas, Outros Mundos, organizada por Marcello Simão Branco e editada pela Ano-Luz em 1998.

O Autor fala sobre a obra

Pátrias de Chuteiras é uma noveleta sobre futebol.
Como é? Não é história alternativa? Sim, também é. Mas, antes de tudo, é a história de uma partida de futebol. No caso, a final de uma Copa do Mundo.
A proposta era escrever um trabalho de ficção que fundisse o assunto futebol aos temas típicos da fantasia, do horror, da ficção científica ou da história alternativa. Caso aprovado, o trabalho integraria a antologia temática que a Editora Ano-Luz estava organizando no início de 1998, a Outras Copas, Outros Mundos. Neste sentido, Pátrias de Chuteiras é o trabalho mais fiel ao propósito precípuo da antologia, pois toda a ação da noveleta se passa dentro de um estádio de futebol, No fundo, a noveleta mostra o que acontece durante essa partida, intercalando à trama futebolística em si, o dilema do técnico de uma das seleções, dividido entre dois sentimentos de lealdade antagônicos: o patriotismo que nutre pelo Brasil e a vontade de defender os interesses da raça negra, discriminada no Brasil e discriminadora em Palmares.
Isto posto, é de todo provável que o leitor pouco afeito ao "rude esporte bretão" não se entusiasme muito com Pátrias de Chuteiras. Paciência. Em minha defesa, só posso apresentar a alegação de que, assim como a ficção científica não se limita a robôs, naves estelares e pistolas-laser, a história alternativa não se limita aos grandes efeitos de decisões militares, que mudam o curso de batalhas decisivas e, portanto, da história como conhecemos.
Em termos de história alternativa, Pátrias de Chuteiras insere-se na linha histórica dos Três Brasis, em tudo idêntica à nossa até 1647, ano em que Maurício de Nassau decide regressar ao nordeste brasileiro para reassumir o governo de Nova Holanda. Nassau estabelece uma aliança com a Confederação de Palmares. Juntas, Nova Holanda e Palmares, conseguem derrotar a Coroa Portuguesa e, como resultado, Palmares torna-se a primeira nação independente da América, cerca de um século antes dos Estados Unidos.
É provável que alguns de vocês já conheçam esta linha histórica alternativa, da leitura das noveletas O Vampiro de Nova Holanda e Assessor Para Assuntos Fúnebres. A maior diferença é que, ao contrário daqueles trabalhos, em Pátrias de Chuteiras o filho-da-noite que atende pela alcunha de Dentes Compridos não dá o ar de sua graça.
A noveleta é o que os estudiosos do gênero da história alternativa - ou ficção alternativa, como preferem alguns - costumam designar como "presente alternativo", ou seja, uma história cuja ação se passa nos dias de hoje, ou bem próximo disso. A decisão da Copa do Mundo dos Estados Unidos se dá em 1986, o ano da passagem do cometa de Halley, e também o ano em que os cientistas de Palmares divulgam para o mundo uma descoberta que mudará os rumos da civilização... Contudo, nada disso é importante para a história da partida.
O drama do técnico Nascimento dos Santos me foi inspirado pelo jogador e técnico Didi.
Para quem não sabe, esse jogador eminentemente técnico foi um dos heróis da vitória da seleção brasileira no Mundial de 1958 na Suécia. Mais tarde, Didi tornou-se técnico da seleção peruana, conseguindo classificá-la para a Copa do Mundo do México, em 1970. Por ironia do destino, as seleções brasileira e peruana se enfrentaram nas quartas-de-final. Antes da partida, discutiu-se muito no Brasil (e provavelmente, também no Peru), como o técnico brasileiro da seleção peruana se comportaria. Ele cantaria o hino nacional brasileiro? Colocaria a mão no peito durante sua execução? E durante a partida em si? Torceria pelo Brasil? Ou pelo Peru?
A ficção exagera a realidade. Em Pátrias de Chuteiras, o negro brasileiro Nascimento dos Santos, considerado o maior jogador de futebol de todos os tempos, torna-se técnico da seleção palmarina. Só que Palmares e Brasil são os piores inimigos. Ao longo de suas histórias, as duas nações já travaram cerca de uma dezena de guerras e conflitos menores. Conflitos onde Palmares quase sempre se saiu vitorioso; a ponto do território brasileiro nessa linha histórica alternativa ter se reduzido aos estados das regiões sul, sudeste e metade da centro-oeste. Como se isto não bastasse, além deste antagonismo histórico, ambas as seleções já se sagraram campeãs mundiais duas vezes e, pelo regulamento da FIFA, a primeira seleção nacional a se sagrar tricampeã mundial conquistará a posse definitiva da Taça Jules Rimet, um troféu de ouro maciço que, muito mais que seu valor material, trará consigo imenso prestígio político ao país que conseguir levá-lo para casa.
Se mesmo em nossa linha histórica, futebol no Brasil já é coisa séria, na LHA descrita, essa partida se desenrola como autêntica batalha campal - reflexo não só da rivalidade de mais de três séculos entre brasileiros e palmarinos, como do choque entre duas visões de mundo muito diferentes, e de dois ideais de superioridade racial incompatíveis.
Na época em que a antologia Outras Copas, Outros Mundos foi publicada, alguns leitores me perguntaram se Nascimento dos Santos seria um "Pelé Alternativo". A resposta é depende. Depende do que se entenda por "Pelé Alternativo".
Em termos estritos, não. É inconcebível imaginar a existência do futebolista Edson Arantes do Nascimento numa LHA que já divergiu da história que conhecemos há mais de três séculos. Não obstante, alguns paralelismos histórico-pessoais que, por capricho, decidi introduzir no enredo.
Em termos genéricos, eu diria que sim. Embora não seja o Pelé, o personagem Nascimento dos Santos foi livremente inspirado nessa grande figura da história esportiva, e foi idealizado como uma homenagem ao Pelé de NLH.
 
Gerson Lodi-Ribeiro, Março de 2002

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Pátrias de Chuteiras

Incluído em:

Outras Copas, Outros Mundos

org. Marcello Simão Branco

Ano-Luz (Brasil)

1998

Gerson Lodi-Ribeiro escreveu:

 

Outras Histórias...

Editorial Caminho

Colecção Caminho Ficção Científica, nº 179

1997

 

O Vampiro da Nova Holanda

Editorial Caminho

Colecção Caminho Ficção Científica, nº 187

1998

 

Terror em Pedra Torta

(com Miguel Carqueija)

Gerson Lodi-Ribeiro organizou:

 

Como Era Gostosa, a Minha Alienígena!

Editoria Ano-Luz (Brasil)

2002

(leia a crítica de Eduardo Torres)