Escape From Loki
por Philip José Farmer
uma crítica de Octávio Aragão
publicada em 23.12.2001
republicada em 02.07.2003
"Spiders, men and Mother Nature make trapdoors.
This trapdoor was Hers. It was made of air and water, but the springing mechanism was confusion in the mind of the man who had ventured onto it. What seems Up may be Down.
Like a young god who had stepped onto a trapdoor, Lieutenant Clark Savage fell from the heavens into hell."
Como não se apaixonar por um romance que começa assim...?
Eis a abertura de Escape From Loki, 216 páginas de duelos aéreos com biplanos, perseguições em trens, fugas espetaculares, caçadas humanas, escaladas de montanhas íngremes e geladas, confrontos até à morte, mulheres belas e fatais, vilões terríveis, galhofas diante da morte iminente... ou seja todos os clichês possíveis e imagináveis, porém, com um diferencial: tudo embalado numa prosa de inegável qualidade.
Phillip José Farmer constrói uma homenagem aos pulps aventurescos produzidos durante as décadas de 30/40, mais especificamente àqueles escritos por Lester Dent e sua equipe (sob o pseudônimo coletivo de Kenneth Robeson) para a série Doc Savage, Man of Bronze, procurando recriar o clima dos livros originais, mas acrescentando seu inegável talento e cultura vasta à receita do bolo. Afinal, não é todo dia que se vê citações feitas com conhecimento de causa a Platão, Freud e Nietzsche nas páginas de um pulp.
O plot é mais ou menos o seguinte: durante a WWI, o superdotado tenente James Clarke Savage, piloto americano de apenas 17 anos incompletos, mas aparentando muito mais, é feito prisioneiro após atuar com a força aérea francesa, num campo de concentração alemão para prisioneiros "incorrigíveis", ou seja, aqueles que sempre tentam fugir. O tal campo, chamado "Loki", é, supostamente, à prova de fugas e reúne a fina-flor dos encrenqueiros aliados. Seu comandante é o terrível Barão von Hessel, um médico afeito a experiências em cobaias humanas que anda para cima e para baixo acompanhado de uma gostosíssima nobre russa, Lili Bugov, a condessa Idivzhopu (o que uma beldade anda fazendo num campo de concentração para indivíduos de suposta alta periculosidade e que não vêem mulher há anos é um dos deliciosos mistérios da história).
É nesse campo que somos apresentados aos personagens que viriam a se tornar os amigos inseparáveis de Doc Savage nas mais de 100 novelas escritas por Dent e sua equipe. No melhor estilo folhetinesco, Farmer escreveu uma prequel que embasa todos os trabalhos posteriores feitos com o Homem de Bronze e, assim, desenvolve as personalidades dos coadjuvantes com perfeição. Temos Monk Mayfair, o químico com feições de neanderthal, fortíssimo; Ham Brooks, o advogado janota e bom de lábia; Johnny Littlejohn, arqueólogo de fala complicada; Renny, o engenheiro de punhos anormalmente grandes e que nunca sorri, e Long Tom, gênio em eletrônica. Cada um desempenha um papel importante na narrativa, cuidadosamente estruturada para que suas características fiquem gravadas na mente do leitor.
Mas, como nem tudo são flores, o romance tem problemas...
O "campo de concentração perigosíssimo" mais parece uma colônia de férias para Doc e seus amigos. Nada do clima claustrofóbico, do tipo Lista de Schindler, que seria de se esperar de um local assim. Os alemães, com exceção do Barão, são um bando de frouxos, longe das máquinas de guerra que estamos acostumados a esperar e, para piorar, o final é apressado, com direito a um belíssimo exemplar de Deus Ex-Machina - de exatamente três parágrafos de extensão - para dar cabo de um dos vilões. Pena. Uma história tão bem estruturada merecia um final wagneriano. Há também uma algo deslocada passagem por um cenário lúgubre de magia negra no interior da Bélgica, onde se desenrola uma luta terrível do protagonista em fuga contra uma matilha de cães selvagens, que não cumpre função alguma a não ser demonstrar ao leitor como Savage é alguém decidido e imbatível. Bolas, isso a gente já sabia antes de começar a ler o livro...
Mas nenhum desses problemas desabona o livro. O romance é bom - não o melhor que Farmer pode fazer (quem leu algum livro da série Riverworld sabe do que estou falando), mas com qualidades inegáveis. Se isso é tie-in - as malfadadas adaptações/continuações de séries famosas escritas por vários autores diferentes, cujos exemplos mais óbvios são os romances baseados nos universos de Arquivo X e Star Trek que causam verdadeiras reações de ódio nos fãs tradicionais de FC literária - que venham outros!
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